A atividade de tradutor ou intérprete público possui grande relevância, seja no âmbito judicial, seja no campo extrajudicial. Havia uma série de regramentos que tratavam do tema, podendo ser citados a Lei 7.409/85, o Decreto 13.609/43, o Decreto 84.248/79 e o Decreto 20.256/45, todos revogados pela recente Medida Provisória 1.040/2021.
A Medida Provisória consolidou uma série de regras sobre essas profissões. A título de exemplo, veja os requisitos presentes no art. 18:
“Art. 18. São requisitos para o exercício da profissão de tradutor e intérprete público: I – ter capacidade civil; II – ter formação em curso superior completo em qualquer área do conhecimento; III – ser brasileiro nato ou naturalizado; IV – ser aprovado em concurso para aferição de aptidão; V – não estar enquadrado nas hipóteses de inelegibilidade previstas na alínea “e” do inciso I do caput do art. 1º da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990; e VI – ter registro na junta comercial do local de seu domicílio ou de atuação mais frequente.”
Note que o inciso IV menciona a necessidade de aprovação em um concurso. Mas que certame seria esse? O art. 21 da Medida Provisória esclarece os detalhes:
“Art. 21. O concurso para aferição de aptidão de que trata o inciso IV do caput do art. 18: I – será válido por prazo indefinido; II – incluirá prova escrita e prova oral, com simulação de interpretação consecutiva, para avaliar a compreensão das sutilezas e dificuldades de cada um dos idiomas; III – será organizado nacionalmente pelo Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria de Governo Digital da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, com apoio das juntas comerciais dos Estados e do Distrito Federal; e IV – será regido pelas normas editadas pelo Diretor do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria de Governo Digital da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.”
Ressalte-se que um mesmo profissional pode se habilitar em um ou mais idiomas:
“Art. 19. O tradutor e intérprete público poderá se habilitar e se registrar para um ou mais idiomas estrangeiros.”
Quanto à relevância destas profissões, como se sabe, há atos que são privativos desses profissionais, como se nota no art. 22 da MP:
“Art. 22. São atividades privativas dos tradutores e intérpretes públicos: I – traduzir qualquer documento que tenha de ser apresentado em outro idioma perante pessoa jurídica de direito público interno ou serviços notariais e de registro de notas ou de títulos e documentos; II – realizar traduções oficiais, quando exigido por lei; III – interpretar e verter verbalmente, perante ente público, a manifestação de pessoa que não domine a língua portuguesa se não houver agente público apto a realizar a atividade ou se exigido por lei específica; IV – transcrever, traduzir ou verter mídia eletrônica de áudio ou vídeo, em outro idioma, certificada por ato notarial; e V – realizar, quando solicitados pela autoridade competente, os exames necessários à verificação da exatidão de qualquer tradução que tenha sido arguida como incompleta, imprecisa, errada ou fraudulenta.”
Aliás, o novo regramento excepciona poucos casos em que sua ausência possui fé pública:
“Art. 23. (…)
§ 1º Nenhuma tradução terá fé pública se não for realizada por tradutor e intérprete público, exceto as traduções: I – feitas por corretores de navios, em sua área de atuação; II – dos manifestos e documentos que as embarcações estrangeiras tiverem de apresentar para despacho aduaneiro; III – realizadas por agentes públicos com cargo ou emprego de tradutor ou intérprete ou que sejam inerentes às atividades do cargo ou emprego; e IV – que se enquadrem nas hipóteses previstas em ato do Poder Executivo federal.”
Ocorre que, muitas vezes, existem localidades em que não se encontra um tradutor ou um intérprete público, ou mesmo aquele existente está impedido de atuar ou indisponível. Nesse caso, a Medida provisória cria a possibilidade de designação ad hoc:
“Art. 22 (…)
Parágrafo único. O disposto no caput não impede: I – a designação, pela autoridade competente, de tradutor e intérprete público ad hoc no caso de inexistência, impedimento ou indisponibilidade de tradutor e intérprete público habilitado para o idioma; e (…)”
As traduções possuem presunção de veracidade diante de sua fé pública, mas a presunção é relativa, podendo sucumbir mediante prova contrária:
“Art. 23. Presumem-se fiéis e exatas as traduções realizadas pelos tradutores e intérpretes públicos.
§ 2º A presunção de que trata o caput não afasta: I – a obrigação de o documento na língua original acompanhar a sua respectiva tradução; e II – a possibilidade de ente público ou qualquer interessado impugnar, nos termos estabelecidos nas normas de processo administrativo ou de processo judicial aplicáveis ao caso concreto, a fidedignidade ou exatidão da tradução.”
De fato, cabe ao profissional juntar o documento original com a sua tradução, podendo a parte interessada impugnar o trabalho realizado.
No entanto, surge a pergunta: e se o profissional fizer traduções incompletas, erradas ou mesmo fraudulentas, o que ocorre? Bom, além da possibilidade de responsabilização civil e penal (se for o caso), haverá, ainda, penalização administrativa:
“Art. 24. Os tradutores e intérpretes públicos que realizarem traduções incompletas, imprecisas, erradas ou fraudulentas estarão sujeitos às seguintes sanções, além de eventual responsabilização civil e criminal: I – advertência; II – suspensão do registro por até um ano; e III – cassação do registro, vedada nova habilitação em prazo inferior a quinze anos.
Parágrafo único. A dosimetria da pena considerará: I – as punições recebidas pelo tradutor e intérprete público nos últimos dez anos; II – a existência ou não de má-fé; e III – a gravidade do erro ou a configuração de culpa grave.”
Esse processo administrativo será julgado pela Junta Comercial do Estado (ou Distrito Federal) no qual o profissional esteja inscrito:
“Art. 26. O processo administrativo será processado e julgado pela junta comercial do Estado ou do Distrito Federal no qual o tradutor e intérprete público estiver inscrito.
Parágrafo único. Caberá recurso da decisão da junta comercial ao Diretor do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração, que decidirá em última instância.”
Juiz do Trabalho. Professor de Direto do Trabalho, Direito Processual do Trabalho e Direito Administrativo.